segunda-feira, dezembro 03, 2007

Solilóquios da alma

Samuel Câmara
Pastor da Assembléia de Deus em Belém


Certo homem, quando indagado por que sempre conversava sozinho, respondeu: “Tenho dois motivos: primeiro, porque gosto de ouvir uma pessoa inteligente falar. Segundo, porque gosto de falar com uma pessoa inteligente”.

Há esquisitices de todo tipo. Em todo lugar podem ser vistas pessoas que andam pelas ruas profundamente entretidas em seus solilóquios, como se travassem discussões sérias. Não é difícil encontrar crianças falando sozinhas, ou que têm “amigos secretos” que nada mais são que elas próprias. Há quem recorra a práticas excêntricas, como a “terapia do espelho”, quando fala consigo mesmo cara a cara diante do espelho e o “eu” derrama a alma diante de “mim”.

O que importa, afinal, não é só o que as pessoas falam quando conversam consigo mesmas. Importa mais saber que não se pode mentir para si próprio. Mesmo que trave uma luta interna de si para si, quando o “eu” que quer fazer o bem se contrapõe ao “eu” que quer fazer o mal, a consciência estará lá como “juiz”.

Paulo expressou bem isto em sua carta aos romanos: “Porque nem [eu] mesmo compreendo o meu próprio modo de agir, pois não faço o que [eu] prefiro, e sim o que detesto. Ora, se [eu] faço o que [eu] não quero, consinto com a lei, que é boa” (Rm 7.15). Incluímos o [eu] no texto original para indicar que, na briga dos “eu” internos, na medida em que consinto com a lei, acabo me tornando o meu próprio juiz.

O que converso comigo mesmo fala mais de mim do que aquilo que falo de mim mesmo a outras pessoas. Eu me descubro mais a mim mesmo do que o faço a outras pessoas.

Jesus sabia disso. Está escrito que Jesus “não precisava de que alguém lhe desse testemunho a respeito do homem, porque ele mesmo sabia o que era a natureza humana” (Jo 2.25). Por isso Ele fazia perguntas e esperava a resposta, ou seja, que a pessoa saísse de seu “casulo” existencial para depois curá-las de suas mazelas.

Como Ele conhecia essa predisposição humana de conversa do “eu-comigo”, foi contundente quanto à essência desses solilóquios. Ele disse: “O homem bom do bom tesouro do coração tira o bem, e o mau do mau tesouro tira o mal; porque a boca fala do que está cheio o coração” (Lc 6.45).

O que é conversado na intimidade do “eu-comigo” revela o que está em cada coração. Podem ser coisas boas, coisas ruins, coisas sábias, coisas tolas, coisas saudáveis, coisas doentias. O resultado é determinado pelo que está no coração.

Jesus contou a história de um fazendeiro rico que adorava um bom solilóquio. A colheita daquele ano fora abundante, de modo que ele “arrazoava consigo mesmo” e dizia o que tinha de fazer. Como concluiu que tinha bens acumulados para muitos anos, disse a si mesmo: “Descansa, come, bebe e regala-te” (Lc 12.16-19).

Parecia que ninguém estava a ouvi-lo, mas Deus o observava. Então, Deus lhe disse: “Louco, esta noite te pedirão a tua alma; e o que tens preparado, para quem será?”

Penso que a mensagem de Jesus procura chamar a atenção para o fato de que somos o que pensamos. Quando alguém fala consigo mesmo, está simplesmente “pensando alto”, revelando o que está no seu coração. Se seus pensamentos são maus, você será mau; se seus pensamentos são puros, sua vida será pura.

Jesus alertou para o fato de que uma oração egoísta – aquela que se presta a achar defeitos nos outros em vez de assumir suas próprias falhas – é um simples monólogo. Ele falou que um “fariseu, posto em pé, orava de si para si mesmo”, enquanto se louvava e acusava outro homem (Lc 18.9-11). Mas quem foi justificado foi o outro, não ele.

Fale consigo, pergunte a si mesmo como está sua situação diante de Deus. Pergunte-se onde passará a eternidade. Pergunte se precisa de Deus. Deixe o “eu” responder a verdade. Depois, fale com Deus sobre isto. Ele ouvirá você e ajudará a sua vida.

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