G12, M12, MDA e a “quebra de paradigmas”
Muitas igrejas — inclusive, algumas Assembleias de Deus —
têm adotado, nos últimos anos, o modelo da “visão celular”, também conhecido
como G12, M12, MDA (Modelo de Discipulado Apostólico), etc. Tal modelo vem
sendo apresentado como o mais eficaz meio de “fazer discípulos”. E os seus
defensores, que se consideram imitadores da igreja primitiva, afirmam que sua
estratégia de discipulado é uma revolução, uma “quebra de paradigmas” e, ao
mesmo tempo, um retorno aos princípios da igreja de Atos dos Apóstolos. Não se
trata, pois, de mais um programa. A “visão celular” é, modéstia à parte, “o
programa” da igreja.
Desde 2006 pesquiso sobre o modelo em apreço e tenho ouvido
alguns líderes de igrejas em células, especialmente os que trabalham com a
juventude, afirmarem que não seguem padrões éticos, dogmáticos, eclesiásticos
de pessoas maduras na fé, experientes ou tradicionalmente respeitáveis.
Preferem valorizar as “ministrações específicas” em pré-encontros, encontros,
pós-encontros, encontros de líderes, etc. Ninguém está autorizado a descrever o
que acontece nessas reuniões secretas. Mas todos concordam: “É tremendo”.
As igrejas em células, em geral, têm os seus próprios cursos
e conteúdos pedagógicos. Não investem na Escola Dominical; consideram-na
ultrapassada, uma instituição falida. Dizem, sem nenhuma cerimônia, que as
igrejas tradicionais ou conservadoras seguem padrões arcaicos e “comem pão
amanhecido, seco e duro”. Os adeptos da “visão” desprezam, reprovam, a liturgia
tradicional das igrejas que não seguem o modelo celular.
Na prática, os líderes que dizem estar “quebrando
paradigmas” estão oferecendo aos crentes vários atrativos do mundo, dentro de
um contexto pretensamente evangélico. Mediante a estratégia da
“contextualização”, tudo é feito para agradar as pessoas, uma vez que o
objetivo primário da “visão” é o crescimento numérico, e não a formação de
crentes segundo a Palavra de Deus. Prevalecem nas igrejas em células — às
vezes, de maneira camuflada — doutrinas triunfalistas, como a Confissão Positiva,
a Maldição Hereditária e a Teologia da Prosperidade.
Tudo gira em torno das células, reuniões realizadas em casas
de pessoas favoráveis à “visão”. Há cultos nos templos, mas nenhuma reunião é
mais importante que as células, definidas como “a essência da vida da igreja”.
Nessas reuniões, ocorre a chamada “oração profética”, recheada com palavras de
ordem ao Diabo: “decretamos”, “ordenamos”, “quebramos”, “maniatamos”, etc. Há
também espaço para manifestações estranhas, como o “cair no poder” — até as crianças
caem.
A liturgia das igrejas em células é baseada no princípio
“Pregue o Evangelho da maneira que as pessoas querem ouvi-lo, e não da forma
que precisam ouvi-lo”. A ordem é não se prender a regras ou princípios.
Empregam-se, nos chamados cultos: danças, coreografias e apresentações
teatrais, principalmente como atrativos para a juventude. Tudo começa com um
“louvor de guerra”, que dura uns vinte minutos. A oferta é um dos principais
momentos e, por isso, merece uns dez minutos. Depois disso, há geralmente uma
“oração de guerra” — dez minutos — e uma apresentação teatral de uns quinze
minutos. Em seguida, uns 25 minutos de mais apresentação musical... Quanto
tempo para a pregação? Em média, quinze minutos!
Segundo os defensores da “visão”, o que um sermão levaria 45
minutos ou uma hora para fazer, consegue-se com uma pequena apresentação
musical “ungida”. Por que, então, Jesus e Paulo pregaram tanto, se isso não é
tão importante? Por que dois terços do ministério terreno do Senhor foram
destinados à pregação e ao ensino da Palavra de Deus? Nada deve substituir a
explanação das Escrituras (Rm 10.17; Sl 119.130).
Como a exposição tradicional das Escrituras é considerada
longa, cansativa e formalista, os pregadores da “visão” têm linguagem própria e
atualizada para cada público em particular. Empregam gírias, expressões em
inglês e regionalismos; tudo para agradar o auditório. Adaptam as passagens
bíblicas às necessidades comuns do homem de hoje, bem como à realidade
existencial da juventude. E as pregações, além de sucintas, costumam ser
acompanhadas de peças ou dramatizações.
Nas reuniões da “visão”, os participantes batem os pés e
gesticulam à vontade, sem restrições, além de marcharem. A ênfase recai sobre
as músicas, as danças, as coreografias, etc. Não há lugar para hinários
tradicionais, como Harpa Cristã, Cantor Cristão, etc. Dizem que cantar hinos
ultrapassados é idolatria. Tais hinos, segundo eles, parecem ter sido compostos
para um funeral.
Há, ainda, nesses “cultos” dirigidos por líderes que
“quebram paradigmas”: aplausos, brados, pulos de alegria, faixas, cartazes,
balões, bandeirinhas, lenços... As palavras de ordem são: exagerar e
extrapolar. “Sentiu vontade de fazer? Faça.” — dizem. — “Se parecer exagero,
execute! O Senhor não está interessado se o adoramos de ponta-cabeça, sentados,
em pé, deitados, chorando, sorrindo, cantando, falando, gemendo, gritando e até
gesticulando o corpo”.
Nas igrejas em células, geralmente, os aspirantes a pregador
recebem instruções como: “seja bem-humorado; use termos joviais, expressões em
inglês e termos regionais; faça brincadeirinhas; pregue com emoção; não seja um
chato”. Os pregadores têm de ser, obrigatoriamente, animadores de auditório. Um
influente líder da juventude afirmou: “Se você quer pregar sem se
contextualizar, esqueça! Estamos cansados de tanta cerimônia, de tanta
opressão, de tanta mesmice”.
Os pregadores da santificação não são bem-vindos. “As
pessoas não vão aos cultos para serem repreendidas, mas para buscar soluções
para problemas, conflitos, receber alívio para seus sofrimentos; enfim, para
satisfazer as suas necessidades.” — dizem os defensores desse evangelho
antropocêntrico. À luz das Escrituras, o compromisso do pregador é com o
Senhor. Quando Ele mandou Ezequiel profetizar, disse-lhe que o auditório não o
ouviria, pois era “casa rebelde” (Ez 2.1-4). O homem de Deus deve pregar, quer
ouçam, quer deixem de ouvir, porque o seu compromisso é com Deus (v. 5). Jesus
não elogiou ou agradou Nicodemos, mas lhe disse, com franqueza, que era
necessário nascer de novo (Jo 3.1-5).
Ademais, a “visão celular” valoriza as estratégias de
marketing. Os líderes falam muito aos seus liderados sobre atacado e varejo; o
marketing pessoal também é fundamental. “Empreender é como espalhar logotipos.
É deixar a marca pessoal em tudo que se realiza. O anonimato, a modéstia são
para quem não tem o que mostrar ou fazer” — afirmam. Deus, entretanto, que não
dá a sua glória a outrem (Is 42.8), “atenta para o humilde; mas ao soberbo
conhece-o de longe” (Sl 138.6). Daí a humildade ser uma característica marcante
na vida dos verdadeiros mensageiros do Senhor (Mt 11.28-30; Jo 3.30; Gl 2.20).
Ciro Sanches Zibordi